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Carnaval a portaria autoriza crianças em desfiles a partir dos 8 anos!

Publicada em: 19/01/2024 13:17 - Corumbá - MS

Corumbá-MS,

A portaria assinada pelo juiz da Infância e Adolescência, Maurício Cleber  Miglioranzi  Santos,  determina as regras de participação de crianças e adolescentes no Carnaval de Corumbá e Ladário foi publicada nesta quinta-feira (18)

O documento se refere ao período entre 9 a 13 de fevereiro, com extensão até dia 19 do mesmo mês, considerado o pós-carnaval. 

Confira a portaria na íntegra !


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL COMARCA DE CORUMBÁ-MS 1ª VARA CÍVEL - INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA PORTARIA N° 001/2024 - “PORTARIA DE CARNAVAL” Maurício Cleber Miglioranzi Santos, MM. Juiz de Direito da Infância e Adolescência da comarca de Corumbá, Estado de Mato Grosso do Sul, na forma da Lei, com competência sobre o município de Ladário, no uso de suas atribuições previstas na Lei n° 8.069/90;


CONSIDERANDO que à Justiça da Infância e Adolescência compete Disciplinar através de Portarias, ou autorizar mediante Alvará a entrada, a participação e a permanência de crianças e adolescentes em locais públicos e de diversão, nos termos do artigo 149, da Lei n. 8.069/90.


CONSIDERANDO o espírito de prevenção e de proteção da referida lei.


CONSIDERANDO o teor da decisão exarada pelo Superior Tribunal de Justiça nos autos do REsp 1292143.


CONSIDERANDO, por outro lado, as limitações práticas de diligenciamento individualizado de cada um dos estabelecimentos/entidades/eventos, que “estaria praticamente obstaculizado qualquer regramento, por parte do juiz, daqueles casos que demandassem a edição de portaria. Imagine-se se, para regulamentar o ingresso de crianças e adolescentes em bares, boates, fliperamas, entre outros, tivesse o julgador de investigar cada estabelecimento, para então regrá-lo. Em cidades grandes é absolutamente inviável” (Bruno Heringer Junior, Promotor de Justiça/RS). Na esteira desse pensamento, José Luiz Mônaco da Silva (ob. cit., pp. 256 e 257), em comentário ao § 2º do art. 149, ensina: "Se o presente parágrafo não for bem entendido, por certo conduzirá o intérprete a uma inegável contradição com a norma disposta no caput do artigo. O que ele quer expressar, em linhas gerais, é que, afora a matéria disciplinada por meio de portaria judicial, os demais atos judiciais consubstanciados em alvarás judiciais não se submetem a decisões de caráter geral, antes prestam inteira vassalagem a cada caso que for endereçado à autoridade judiciária."1


CONSIDERANDO o entendimento que vem se consolidando no sentido de que “descabe ao magistrado disciplinar as liberdades de terceiros”2 , bem como que “tais portarias somente têm algum efeito em cidades do interior, pois em metrópoles, se existissem, seriam praticamente ignoradas”, bem como que “cabe aos pais ou responsável determinar onde e como seus filhos ou pupilos passeiam”3 .


CONSIDERANDO o princípio do melhor interesse da criança, da proteção integral e da condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, acrescidos dos demais fatores previstos no parágrafo §2º do art.149 do ECA.


CONSIDERANDO a sobrelevada relevância à autonomia do poder familiar e daqueles que o exercem por outras vias (guarda/tutela), bem como o direito à livre locomoção que se estende a crianças e adolescentes, conforme deflui da leitura dos arts. 75 e 149, inciso I, do ECA, bem como que, no exercício do poder familiar, compete a ambos os pais “dirigir-lhes a criação e a educação”, “reclamá-los de quem ilegalmente os detenha” e, ainda, “exigir que lhes prestem obediência e respeito”, conforme art. 1.634, incisos I, VIII e IX, do Código Civil.


CONSIDERANDO a peculiaridade da Comarca, fronteiriça com a Bolívia, bem como o incremento de ingresso de nacionais bolivianos diante da defasagem da moeda brasileira.


CONSIDERANDO que o Carnaval constitui-se em evento cultural amplamente difundido em território nacional, especialmente arreigado à cultura local (Corumbaense e Ladarense), do qual as famílias 1 Disponível em http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp? id=155. Acesso em: 7.11.2014. 2 NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da criança e do adolescente comentado: em busca da constituição federal das crianças e dos adolescentes. Rio de Janeiro: Forense, out./2014. Págs. 509 e 511. 3 NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da criança e do adolescente comentado: em busca da constituição federal das crianças e dos adolescentes. Rio de Janeiro: Forense, out./2014. Págs. 509 e 511. participam intensamente.


CONSIDERANDO recorrentes modificações da Portaria de Carnaval deste Juízo pela Egrégia Corregedoria-Geral de Justiça.


CONSIDERANDO decisões do Eg. TJMS com relação à incompetência deste Juízo de Infância e Adolescência para tratar da venda de ingressos a preços diferenciados a crianças e adolescentes nos eventos denominados “open bar”.


CONSIDERANDO a relevância de conscientização social e comunitária a todo o cidadão para que contribua na fiscalização da regularidade dos alvarás exigidos a toda atividade em que estejam presentes crianças e adolescentes, notadamente in memoriam das vítimas da tragédia da Boate Kiss, ocorrida em 27 de janeiro de 2013 e que provocou 242 mortes e deixou 636 feridos .


RESOLVE: Disciplinar a entrada e permanência de crianças e adolescentes em locais de diversão, no período carnavalesco de 2024 (mais especificamente entre 9/2/2024 e 13/2/2024), bem como até o dia 19/2/2024 (pós-carnaval) nos seguintes termos:


Art. 1.º Para os fins previstos nesta, portaria é o ato regulamentar genérico e abstrato que impõem o regramento em eventos nos quais haja participação de crianças e adolescentes, bem como os requisitos necessários a serem observados pelos promotores de eventos para tanto;


Art. 2.º Para os fins previstos nesta, alvará é o ato jurisdicional que versa sobre situação concreta não regulamentada pela presente;


Art. 3.º A partir da edição da presente estão dispensados os promotores de evento do requerimento de autorização judicial  para sua realização, devendo, contudo, observar integralmente os requisitos da presente.


Art. 4°. São permitidos o ingresso e permanência de crianças e adolescentes nos eventos carnavalescos com as seguintes limitações:


I- em relação aos desfiles de rua (escolas de samba, trios elétricos, blocos e correlatos) e concentrações em recinto aberto:

a) crianças e adolescentes podem assistir aos desfiles de rua sem limitação de horário, desde que acompanhados dos pais ou responsáveis, sem que os exponham a situação de risco;

b) somente crianças maiores de 8 (oito) anos podem participar dos desfiles de rua, desde que acompanhadas ou autorizadas expressamente por seus pais ou responsáveis, e em ala própria, com monitores, adotando-se todos os cuidados necessários para que não sofram risco à segurança ou à integridade física;

c) os adolescentes (a partir de 12 anos de idade) podem participar de desfiles de rua, desde que acompanhados ou autorizados expressamente por pais ou responsáveis (leia-se, guardiães ou tutores munidos dos respectivos termos judiciais);


II- em relação a bailes, clubes e outros recintos, abertos e fechados:


a) crianças (menores de 12 anos) somente podem participar de matinês, encerradas até as 21h00min, acompanhadas dos pais ou responsáveis;

b) adolescentes (a partir dos 12 anos de idade) podem participar de bailes carnavalescos em clubes e outros recintos fechados desde que acompanhados ou autorizados por seus pais ou responsáveis (leia-se, guardiães ou tutores munidos dos respectivos termos judiciais).


Art. 5º. O controle do ingresso e permanência de crianças e adolescentes incumbe aos promotores do evento (e/ou responsáveis pela Escola ou Bloco carnavalesco), a quem toca obrar em diligências capazes de preservar sua integridade física e moral, com especial atenção para a vedação do consumo de álcool e outras substâncias entorpecentes.


Art. 6º. Na hipótese de evento em que se realize comercialização de bebidas alcoólicas ou que esta constitua parte do preço (com vistas ao lucro), é indispensável a pertinente identificação (pelo promotor do evento) das pessoas que se encontram na maioridade mediante instrumento próprio, tal qual pulseira na cor vermelha, a fim de viabilizar o controle da ingestão de bebida alcoólica.


Art. 7º. A realização de eventos carnavalescos em que haja cobrança de ingresso ou comercialização de bebida alcoólica em favor do promotor dispensa alvará judicial, porém não dispensa que o ambiente possua (1) alvará do Corpo de Bombeiros; ciência e não oposição da (2) Polícia Militar e (3) do Conselho Tutelar, bem como alvará da (4) Polícia Civil e do respectivo (5) Município, quando o caso;


§ 1º. Ainda, será exigível a presença de equipe de segurança regularmente credenciada junto à Polícia Federal, providência que deverá ser fiscalizada pelos órgãos competentes nos eventos. A comprovação se dará mediante cópia do contrato e do destacamento de homens suficientes para garantia da segurança do ambiente e, ao menos, uma segurança do sexo feminino.

§ 2º. Tratando-se de evento promovido por entidades públicas, observado o princípio da presunção de legitimidade dos atos administrativos, é dispensado o alvará judicial, sem prejuízo do cumprimento dos ônus legais pertinentes.


Art. 8º. As disposições desta portaria não alteram as normas legais e regulamentares, tampouco restringem o poder familiar, o qual, no entanto, deverá ser exercido pessoalmente pelo responsável legal ou por terceiro expressamente autorizado, somente cabendo intervenção na hipótese de ser encontrada criança ou adolescente em situação de risco (art. 98 do ECA).


Parágrafo único: constatado que o responsável legal encontra-se em situação que exponha a risco criança e adolescente, tais como acentuada embriaguez, drogadição ou submissão deste a ambiente de flagrante inadequação, deverão os agentes públicos atuar aplicando as medidas legais cabíveis, nos termos do ECA.


Art. 9º. É permitido o ingresso da Autoridade Judiciária e dos servidores da Justiça, do Ministério Público e de seus servidores, polícias Civil e Militar, Conselho Tutelar, membros do CMDCA e das Secretarias de Assistência Social, a todo e qualquer evento, mediante a apresentação de sua identificação funcional e com o objetivo único de fiscalização desta Portaria, cumprindo ao responsável pelo evento a averiguação junto ao superior hierárquico e/ou comunicação a este em caso de suspeita de abuso.


Art. 10. A fiscalização da presente Portaria constitui incumbência de todos os agentes públicos nos limites de suas atribuições (seja ela no âmbito criminal, a fim de obstar o cometimento de crimes relacionados à infância e adolescência, seja ela no âmbito cível/administrativo, a fim de constatar a efetiva existência de alvarás e regularidade dos estabelecimentos), cumprindo ao Conselho Tutelar realizar constatações, ainda que por amostragem, mediante relatório a ser encaminhado à Justiça da Infância e Adolescência.


Art. 11. Os promotores, diretores, administradores, gerentes ou proprietários de estabelecimentos de diversões, responsáveis por Escolas ou Blocos de Carnaval, quaisquer que sejam, e quer se trate de pessoas físicas ou jurídicas, respondem pela ordem e segurança nos recintos durante a realização dos eventos, cabendo-lhes providenciar às suas expensas as medidas necessárias a esse fim, respondendo civil e criminalmente pelas irregularidades e excessos que porventura venham a ocorrer e por eventual infração ao contido no Estatuto da Criança e do Adolescente.


Art. 12. As disposições gerais previstas nesta portaria aplicam-se a todos os promotores de diversões ou espetáculos carnavalescos, a quem incumbe sua observância pessoalmente, bem como por seus prepostos ou funcionários, sem prejuízo das determinações específicas para cada tipo de diversão ou atividade.


Art. 13. Verificando qualquer infração cometida por qualquer entidade ou estabelecimento referidos nesta portaria, os servidores e agentes públicos deverão lavrar auto circunstanciado de infração (anexo I), nos termos do art. 194 e seguintes do ECA, bem assim o Conselho Tutelar poderá oferecer representação com o mesmo objetivo, encaminhando após ao Juizado da Infância.


Art. 14. Evidenciada circunstância capaz de comprometer a segurança do evento, deverá haver representação para seu encerramento, sem prejuízo das atribuições pertinentes às polícias, Corpo de Bombeiros e à Administração Pública.


Art. 15. Para viabilizar a fiscalização da presente portaria, é indispensável que as crianças e adolescentes, bem como os pais e responsáveis que os acompanharem, estejam munidos de documento pessoal de identificação com foto, aceita a certidão de nascimento para os menores de 12 (doze) anos de idade. Parágrafo Único: as autorizações dos pais/responsáveis (nas hipóteses exigidas) deverão ser feitas por escrito e assinadas por ambos genitores ou pelo responsável legal (guardião/tutor), exigido o reconhecimento de firma em Tabelionato.


Art. 16. O descumprimento dos termos desta portaria, dos deveres inerentes ao poder familiar ou decorrentes de tutela ou guarda, assim como as determinações da autoridade judiciária sujeitarão os responsáveis à pena de multa de 3 (três) a 20 (vinte) salários mínimos, aplicando-se o dobro em caso de reincidência, nos termos do art. 249 do ECA, sem prejuízo da proibição do exercício da atividade caso constatada sua prejudicialidade aos interesses de crianças e adolescentes, observado o contraditório e a ampla defesa.


Art. 17. Os casos não regulamentados nesta portaria serão decididos e analisados pela Justiça da Infância e da Adolescência desta Comarca.


Art. 18. Para ampla divulgação e conhecimento, presta-se a presente Portaria a difundir os seguintes dispositivos legais do ECA: art. 236, 239, 240, 241-A, 241-C, 243, 244, 244-A, 255, 249, 250, 252 e 258.


Art. 19. Publique-se em Cartório, encaminhando-se cópia à Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, ao Ministério Público desta Comarca, à Ordem dos Advogados do Brasil (subsecção Corumbá), à Polícia Civil, à Polícia Federal, à Polícia Militar, ao Corpo de Bombeiros, aos Conselhos Tutelares dos municípios de Corumbá e Ladário e aos Conselhos Municipais dos Direitos das Crianças e Adolescentes dos precitados municípios, requisitando-lhes incremento nas atividades de orientação e fiscalizatórias no âmbito das respectivas atribuições.



Esta portaria entra em vigor a contar de sua publicação. Corumbá, 18 de janeiro de 2024. Maurício Cleber Miglioranzi Santos, Juiz da Infância e Adolescência da comarca de Corumbá.

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