Dias Toffoli, do STF, negou seguimento a recurso e manteve condenação da UFMS a pagar R$50 mil por danos morais
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou um recurso extraordinário e manteve uma
condenação do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) contra a Universidade Federal do Mato Grosso do
Sul (UFMS) por ter punido administrativamente uma servidora que compartilhava
mensagens bíblicas em comunicados oficiais.
No entendimento da maioria dos desembargadores do TRF3, a
servidora foi impedida de exercer seu direito à liberdade de crença. Por isso,
a universidade deverá anular os processos administrativos disciplinares contra
W. M. e indenizar a servidora em R$50
mil por danos morais.
A
disputa se alongou por mais de 10 anos e teve início depois que a servidora no Campus de Corumbá, começou a receber
advertências por escrever mensagens bíblicas no início dos comunicados oficiais
da instituição. Segundo a UFMS, a ação da servidora feriu a laicidade da
universidade e o princípio da impessoalidade. Pelo descumprimento das ordens, W.
M., que se declara integrante da Igreja Adventista do Sétimo Dia, foi punida na
esfera administrativa e chegou a receber uma suspensão de 30 dias .
O caso foi levado à Justiça Federal, que decidiu, em primeira
instância, de forma favorável à UFMS. Após um recurso ao TRF3, por 3 votos
contra 2, os desembargadores reconheceram que as ações da instituição geraram
“uma substancial e indevida restrição à liberdade de crença da servidora”.
Segundo
o desembargador federal Souza Ribeiro, a UFMS tentou induzi-la a deixar de
expressar seu direito a liberdade de crença. Na decisão, o desembargador
considerou que os atos da servidora estão amparados pelo direito de
manifestação pública da crença. Ele qualificou a ação da universidade como
“gravemente ilegítima pela forma como se tentou forçar a autora” “a renunciar
ou abster-se de um direito fundamental de sua personalidade, através de graves
pressões internas em razão de ameaça de punições administrativas”.
A
Corte julgou que os processos administrativos contra ela, foram medidas de retaliação pela insistência
da servidora em não acatar as ordens dos superiores. Nesse sentido, foi
decretada a anulação imediata todas as medidas punitivas contra a servidora.
Além
disso, os desembargadores também destacaram que a conduta da universidade não
tinha amparo em normas legais e “extrapolou prerrogativas funcionais” ao impor
suas convicções internas a respeito da laicidade estatal e liberdade de
religião.
Para
os julgadores, “a laicidade estatal de modo algum expressa o significado que a
UFMS pretende atribuir ao citado princípio, qual seja, no sentido de que o
Estado estivesse proibido de, no exercício de suas atividades, fazer qualquer
referência a crenças”.
“A
prática tão perseguida pela alta direção da UFMS – inserir um versículo bíblico
em correspondências internas da instituição de ensino – na verdade caracteriza
uma clara manifestação histórica e cultural da sociedade brasileira, que nunca
pode qualificar-se como violadora da laicidade estatal”, avaliou a maioria dos
desembargadores. Para eles, as citações bíblicas não trazem em si qualquer
conotação ou efeito de objetivamente constranger qualquer pessoa em sua
liberdade religiosa.
Relator
original do caso, o desembargador Cotrim Guimarães, que ficou vencido,
considerou que ao fazer referências expressas a Deus e à Bíblia Sagrada em
documentos públicos oficiais da universidade, a servidora ultrapassou o campo
da simbologia e da liberdade de crença. Para ele, se a produção de atos
administrativos significa, no plano do Direito, a emissão de declarações do
Estado, e se o Estado é laico, “é inadmissível que, no conteúdo desses mesmos
atos, haja referências a tal ou qual crença religiosa, ainda que seja aquela
hegemônica na sociedade brasileira”.
O
ministro Dias Toffoli, do STF, negou seguimento ao recurso extraordinário
1.406.566, da UFMS, por considerar que houve “mera afirmação genérica de
existência de repercussão geral, desacompanhada de robusta fundamentação da
relevância econômica, política, social ou jurídica da questão constitucional”.
O processo
originário tramita com o número 0001199-60.2012.4.03.6000.
NINO GUIMARÃES – Repórter do JOTA
19/09/2023
